Ama-me

Aos amantes é lícito a voz desvanecida.

Quando acordares, um só murmúrio sobre o teu ouvido:

Ama-me. Alguém dentro de mim dirá: não é tempo, senhora,

Recolhe tuas papoulas, teus narcisos. Não vês

Que sobre o muro dos mortos a garganta do mundo

Ronda escurecida?


Não é tempo, senhora. Ave, moinho e vento

Num vórtice de sombra. Podes cantar de amor

Quando tudo anoitece? Antes lamenta

Essa teia de seda que a garganta tece.


Ama-me. Desvaneço e suplico. Aos amantes é lícito

Vertigens e pedidos. E é tão grande a minha fome

Tão intenso meu canto, tão flamante meu preclaro tecido

Que o mundo inteiro, amor, há de cantar comigo.

Biblioteca Poeta, 2025